domingo, 21 de junho de 2009

Na verdade, não sou um palhaço, disse ela,

faço palhaçadas, para enganar a tristeza, a solidão doente com gente à volta. Aliás, até detesto circo e palhaços, com a honrosa excepção de certas formas do circo novo, nomeadamente o Cirque du Soleil, que nunca tive a oportunidade de ver, porque quando cá vêm actuam sempre em Lisboa, onde tudo acontece, muito longe de mim. Tudo o que é bom tende a acontecer longe de mim, acrescentou, num exagero visível.
Desde sempre que soube que era uma outsider, continuou, depois de ter atirado para fora, convulsivamente, água salgada em litros, que se poderia misturar no oceano atlântico, não estivesse ele longe.
Nunca soube foi porquê. Em tempos diziam-me que eram invejas, por ser demasiado inteligente e ter muitos sucessos escolares. Mas eu sempre achei os outros muito melhores, sempre me achei apenas mediana. Também me disseram que era por ser bonita, o que também gerava invejas. Mas eu nunca fui bonita, sai ao meu paizinho. Bonita sempre foi a minha mãe e a minha filha. Agora, então, estou um pote de banha. Houve quem acertasse e me dissesse que é por ser ingénua, acreditar nas pessoas. Esse alguém fui eu mesma. Mas fui-me tentando enganar, dizendo que não podia ser verdade. As pessoas, no fundo, são boas. Hoje tenho a certeza que não é assim. As pessoas aproximam-se de nós, sugam-nos o que lhes interessa e, depois, afastam-se. Lavam as mãos, como Pilatos. Felizmente, há a excepção de um amigo ou uma amiga, se tivermos sorte. Dois, se tivermos nascido com o cu virado para a lua. Mas os amigos só se fazem na infância ou na adolescência e os meus foram viver para longe de mim, muito longe. Ou eu fui viver para longe deles, dependendo da perspectiva.
De resto, é tudo fogo fátuo. As pessoas mentem, mesmo as que temporariamente nos parecem de confiar. Abusam, o mais possível. Para elas somos objectos. O pior é quando não sabemos se alguém está a ser nosso amigo ou a abusar de nós. A fronteira é muito difícil de estabelecer. Só com o tempo. Normalmente o tempo torna patente a segunda opção. Mais uma vez fui trouxa, mais uma desilusão, já me aconteceu várias vezes.
Hoje estou doente, na solidão acompanhada. Ouço uma banda a tocar lá fora. Num coreto improvisado. As bandas e os coretos trazem-me boas recordações. Mas não tenho força, não consigo sair daqui. Gostava de me juntar às centenas de pessoas simples que se reúnem à volta da banda e gozam o calor do sol. Mas não consigo. Sugaram-me a alma de mil e uma maneiras. Perdi a força. E hoje não encontrei a miúda que diz que para ela não chove.
Calou-se e retomou um choro silencioso.

2 comentários:

Blimunda disse...

Outsider seria uma boa classificação se o sofrimento e a solidão não fosse parte integrante do inside que nós mesmos construimos.

privada disse...

os teus olhos ignoram as letras e fixam as entrelinhas e exclamas: Mas ei afinal... estas palavras são minhas!!
ai saphou so essas dos amigos eh k nao vivi ainda o suficiente para a confirmar sera k eh msm assim?