domingo, 23 de novembro de 2008

Para acalmar o meu espírito atormentado

O simulacro

O simulacro de sismo, segundo a Protecção Civil, foi muito útil para detectar as falhas. Ao que parece, teriamos quinado quase todos. O simulacro do sismo está ao mesmo nível do desnecessário e humilhante jogo amigável contra o Brasil.

Dos buracos negros

Fala-se muito dos buracos negros nas diversas galáxias e dos diversos tipos de buracos negros. Provou-se que no centro da nossa galáxia existe um buraco negro e que no centro da galáxia que está em rota de colisão com a nossa existe também um buraco negro. A fusão dos buracos negros vai ser um show de pirotécnia de tal ordem que o fogo de artifício no São João do Porto ou na passagem de ano na Madeira ficaram para sempre envergonhados, de tal modo que não ousaram reaparecer. O próprio país desaparecerá, com a vergonha.
Do que ninguém fala é dos micro buracos negros que existem nas nossas casas e escritórios. Pairam na atmosfera como quem não quer a coisa, mas papam e transforam em anti-matéria sempre os mesmos objectos.
Desde logo, as canetas, dos mais diversos tipos, cores e feitios e todo o tipo de lápis. Não contentes, sugam as borrachas e aparadores (aguças cá no norte), clips e afins.
Mas não se ficam pelo material de escritório. Não há ganchos de cabelo, nem fitas ou elásticos que lhes resistam. E agora alargam o suganço às agulhas, botões e outras merdinhas do género.
O pior é que estes buracos só são perceptíveis por seres muito sensíveis às vibrações do universo, como eu. A familória que comigo habita tem formas demasiado espessas para compreender o etéreo. Cambada que insensíveis, acham sempre que a culpa é minha.
-Emprestas-me a tua caneta, porque a minha desapareceu? Não, porque tu perdes as canetas todas.
-Tens uma fita para eu fazer um rabo-de-cavalo? Não, porque depois não tenho para o basquete, tu nunca as devolves.
Tenho eu que aturar estes imbecis ignorantes. Nem me vou dar ao trabalho de explicar como é que um buraco maiorzinho transformou em anti-matéria a chave de casa.

Clube de Leitura

Se vendem medicamentos em hipermercados, também podem vender livros em bombas de gasolina. Mas sempre pensei que seriam livros populachos, coisa de segunda. Fiquei chocada ao ver o meu eterno venerado no escaparate giratório da GALP. Alí, sem pudores, exposto entre os iogurtes e a comida para cão. De GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ, "A hora má: o veneno da madrugada". Ainda em estado de choque, qual foi a minha reacção? Comprar de imediato o único exemplar. Não fosse um paspalho comprá-lo. Traí um amor que remonta a "Cem Anos de Solidão". Ser obrigada a comer um pacote de batatas fritas com sabor a churrasco, seria uma penitência adequada.
Alguns livros deveriam ser apenas vendidos em templos literários, como a Lello, nos Clérigos.
Funes deve estar a rebolar de contente. Sempre preferiu Borges. Nem admite comparações. Não rirá por muito tempo. Nenhum autor escapa à fúria das gasolineiras.
Por último, uma sugestão de leitura para o interminável Domingo: "Os Anicetos também trabalham", de Linda Hayward e Irene Trivas, Col. Rua Sésamo. Este só se vende em locais de eleição.