sábado, 25 de abril de 2009

Onde é que estava no 25 de Abril de 1974?

Na que hoje é a Casa Museu Carmen Miranda, protegida, com a alegria própria da puberdade, na companhia da minha mãe e do meu pai. Lembro-me de ir à sala de estar e ligar a televisão, antes de ir para o Ciclo Preparatório do Marco de Canaveses, tinha aulas mais tarde. Notei algo de estranho. O pivot estava com um ar amedrontado e anunciava a revolução dos Capitães. Não senti qualquer tipo de medo. Aconselhavam, no entanto, a não sair de casa porque era mais prudente.
Chamei os meus pais. Perguntei o que era aquilo. A minha mãe mostrou-se preocupada, porque o poder ia cair na mão das pessoas erradas. O meu pai disse:- "Já não era sem tempo!"
A confiança e o entusiasmo demonstrados pelo meu pai deixaram-me também confiante e entusiasmada. Os dois estávamos contagiados pelo idealismo dos Capitães de Abril.
Ainda fui até ao Ciclo, mas mandaram-nos embora. Naquele dia não havia aulas. Todo o resto do dia foi passado entre as brincadeiras com as amigas e a excitação das notícias.
O destrambelho que se seguiu à Revolução não atingiu a minha pequena família, exilados na província, onde nada acontecia, parecia tudo na mesma. Apenas notava algo de estranho quando vínhamos ao Porto ao fim-de-semana e tínhamos que gramar com as operações stop. Essa parte era chata. Lembro-me de uma vez que demoramos mais de 5 horas entre Santo Ovídio e a Ponte da Arrábida, numa altura onde por aquela auto-estrada era raro passar alguém (nesse tempo ainda havia resquícios da discussão acerca da utilidade de uma ponte construída num local onde poucos carros passavam). A minha mãe e o meu pai continuaram a exercer as suas profissões, como sempre. Desse ponto de vista, fui uma privilegiada.
Quando vim viver para Vila Nova de Gaia já os anos quentes tinham passado.
Volvidos 35 anos, mergulhada no Outono da vida, sem sonhos e decadente, estou em sintonia com a crise do país e do mundo. A consciência dos desmandos cometidos no tempo do PREC, a forma desastrosa (criminosa?) como ocorreu a descolonização, com réplicas até hoje -basta pensar no país inviável que é a Guiné, ou no que ainda acontece em Angola, já para não falar de Timor ou Moçambique, entre outros - deixam-me com uma vaga tristeza e sensação de desperdício.
Se tipos como José Sócrates, o pequeno ditadorzinho socialista arrogante e pretencioso, e Vital Moreia, o camaleão inquisidor, entre muitos outros do género, continuam a medrar, é inevitável a pergunta inútil de saber se o 25 de Abril valeu a pena. O poeta diz que tudo vale a pena, quando a alma não é pequena. Será que assiste razão ao poeta? Mais tarde ou mais cedo, sempre transitaríamos para uma democracia, pela pressão dos tempos. As coisas poderiam ter sido muito diferentes, tanto para o país, como para mim. Paciência. O passado é passado. No presente, o desencanto contaminou-nos. Pode ser que seja transitório.
Apesar de saber que houve terríveis dramas pessoais a par de imensas alegrias de outros, como é o normal curso das coisas, sempre me chocou a forma como o futuro havia de tratar duas pessoas que naquele dia estiveram frente a frente: Marcelo Caetano e Salgueiro Maia.