terça-feira, 25 de agosto de 2009

Sapos na Montanha

Chego sem me anunciar, numa terra pequena, não há hipótese de não atender a campainha. Lá estava ela com os seus 3 filhos, que resolveu criar em ambiente natural porque nas cidades só é possível criar monstros e devemos todos procurar a essência e principalmente dotar as crianças com valores que assentem no prazer e no respeito à natureza e laços familiares estreitos, como os que tinha com a minha avó e bla bla bla.

- Então, como vai essa vida in natura?
- Mal, muito mal, já não estou certa deste local ser o melhor para mim.
- É claro que não é o local para ti, aliás admira-me que depois de conheceres a Bélgica, a Itália, a França e principalmente depois de conheceres o Porto tenhas vindo enfiar-te aqui, decididamente nunca entendi.
- Não é isso Privada, não é a falta de cinema, de espectáculos, de arte, de movimento é uma ameaça que nunca equacionei.
- Qual?

- As cinquentonas Privada, as divorciadas, as viúvas, Privada, tu não fazes uma pequena ideia do que eu tenho sofrido, tu não imaginas.
- Fogo, porque são uma ameaça, não entendo…
- Sabes Privada pensei em tudo, nunca pensei ser traída com uma tipa mais velha que eu, tu achas isto normal, Privada?
- Foste traída, como, pelo Alberto, com uma tipa mais velha, não estás a alucinar?
- Não. Tu não sabes Privada, aqui os homens não podem sair à rua, a sério, é uma promiscuidade total, as gajas não olham a meios, fazem-lhes o cerco, é impossível. Ele é um dos homens mais novo, dos poucos que por aqui restam.
- Bem, não sei o que te diga…
- É incrível Privada, toda a gente sabia. Eu como raramente saio da quinta não percebi, ele estava sempre a discutir, a depreciar-me, se falava era porque falava, se não falava era igual. E a tipa vinha cá a casa e tudo, eu fazia de comer para a gaja Privada, uma viúva , tem quase 50 anos Privada. Sabia de muitos casos, é quase tudo, mas nunca imaginei que o Alberto que até criticava essas cenas pudesse fazer o mesmo.

- Então está bem. E o que vais fazer agora?
- Não sei, ele diz que não se vai embora e não posso pedir o divórcio porque não estou casada.
- Vai tu embora.
- E a casa, e a quinta, como posso ir, precisava de vender isto, ou entrar em acordo, e não há hipótese, ele não aceita nada, diz se quero ir que vá, estou desesperada.
- Caramba, não sei, e se lhe pusesses um par de cornos também?
- Com quem? Já te disse que poucos homens há aqui, não quero ser uma mendiga sexual como as que há a rodos aqui, pá!
- Com uma mulher ou com um Espanhol, é perto.
- Estou desesperada.

- Porque não vamos comer uma mariscada , trazes os meninos e vamos?
- Oh não dá, tenho que esperar por ele para jantar, não tem aí nada e depois era um escândalo.
- Tu mudaste muito, não há duvida.
- Ah Privada, tenho medo de encarnar uma mulher das historias antigas, não sabes o que luto para preservar a minha mentalidade, na rua dizem-me para ter calma, quer dizer toda a gente sabe, Privada, tu imaginas eu no medico e uma velhota a dizer-me para ter calma, Privada?

- Sim e de facto o que é uma traiçãozita, enfim, nada de relevante é normal.
- Aqui é mais do que normal, é uma necessidade, não há homens aqui, é esse o problema. Com esta não contava Privada, mas os meninos estão bem, crescem livres, em total contacto com a natureza, como sempre imaginei.

- Mas já desististe de ter 6, ou não?
- Sim, acho que sim, se as circunstâncias fossem outras, se ele mudasse, se …
- Se não tivesse acontecido o 25 de Abril…
- Aposto, que nem tu tinhas equacionado isto.
- Claro que não, o Alberto sempre foi uma mosca morta, quem imaginaria que ela ia despertar para o sexo quase aos 40?
- Elas aqui até os violam, tu não percebes, é muita mulher, muita viuva, muita divorciada...

- No fundo minha querida Didi, pensando bem, a ruralidade, a natureza tem essas coisas, tens que ler o Torga, o gajo não era assim tão burro, afinal ainda está bem actualizado.
- O Torga sempre foi um parolo.
- Pois, sugeria-te o Lobo Antunes, mas não estou a ver-te a espetar um par de cornos ao senhor vereador.

Vamos lá esclarecer as coisas, de uma vez por todas

Quando a jovem, ou não tão jovem, beija o príncipe encantado, ele transforma-se em sapo e não o oposto. Andam a enganar-nos há séculos, talvez por o conto ter sido escrito no dia 1 de Abril?

Férias II


- Javali estufado pá? Mais carne? Não estão fartos de carnes, churrascos, vinho? Não percebo para que é tanto comer, a toda a hora, fogo!
- Só os fracos se preocupam com o sistema do peso, com as calorias e castigam o seu corpo com tofus e outros vegetais, esperando subir ao céu onde embarcarão toneladas de costeletas de vitela e frango assado em forma de recompensa, só eles ignoram que Deus morreu.

- Zaratustra ?
- Woody Allen.

- A serio? Dele tenho uma ponte de dentes ondulada do dentista Vicent.
- Ah, desse prefiro os animais míticos.
- Sem penas.
- É isso….

Que livres sois...

Acabou a escravatura, os dogmas não fazem sentido e portanto todos se podem considerar livres, no entanto a liberdade é apenas a adequação a uma profissão, a um local que já existe, a um hobby criado e regulamentado…
Liberdade é a simples adaptação ao mundo que os homens livres criaram, quem não se adapta é preso: numa cadeia, num escritório, numa casa, numa cama. Reflectindo bem, nem os primatas foram homens livres dependiam do sol, da chuva, da terra.
Adapta-te ao que tens, ao que fazes e serás um homem livre. Isto não serve, não pode servir, ou então há outro termo para além da liberdade.

Se a liberdade de facto existisse, num ano de crise como o que decorre, seriam poucos aqueles que livres, escolheriam voltar ao trabalho.

Os contemporâneos: Eusébio Hoje