domingo, 17 de janeiro de 2010

Ajude as vítimas do Haiti:760 20 22 22; Sting, Fragile, porque de comum há o sofrimento sem fim

Raiva

A raiva é o reverso do medo. Quanto mais medo, mais raiva, quanto mais raiva, mais medo, e a bola de neve aumenta até à implosão ou explosão. O medo é a raiva reprimida. Duas faces de uma moeda. Se alguém se sente profundamente ferido, ou chora em silêncio num canto, ou leva tudo à frente. Em ambos os casos, são sentimentos densos, má vibração, que causa dano ao próprio, a ponto de ficar com infecções ou doenças mais graves.
Não a deixaram dormir. Entupida em comprimidos, foi deitar-se cedo, porque já não aguentava mais aquela gente. Mas às duas da manhã foi acordada por dois elefantes, e não podia entupir-se mais em comprimidos... ficou acordada até às 6 horas da manhã a olhar para o nada e a enraivecer-se, cada vez mais.....quando, finalmente adormeceu, foi de novo acordada pelos que têm actividades no turno da manhã, e a raiva foi crescendo, até começou a temê-la.
Decidiu tomar banho, mas só havia água fria, os do turno da manhã aqueceram-se com ela. A raiva tornou-se um furacão, era capaz de levar tudo à frente, matar sem remorso, dar cabo de tudo...se fosse psicopata. As vinganças imaginadas ficaram-lhe na raivosa mente a entupir o raciocínio.
Tentou almoçar, mas impediram-na, porque os tipos da noite, ainda a dormir, tinham prioridade.
A raiva apoderou-se dela definitivamente, começou a disparatar para todos os lados, com ou sem razão, que importava: não a tinham deixado dormir, tomar banho, nem almoçar....
À espera do AVC ou do enfarte, dado o estado alterado, olhou fixamente para a televisão.
No meio de um cenário de total destruição, viu crianças e adultos no Haiti, a sorrir com genuína alegria, por terem conseguido abarcar no colo bolachas vitaminadas e um pouco de água. Sorriam, apesar de terem perdido a casa, a família, os amigos, o país...
Sentiu-se o ser mais estúpido do universo e arredores, mas nem por isso a raiva acalmou. Apenas ficou com uma raiva calada, apática, à espera das réplicas que se iriam suceder.