segunda-feira, 16 de março de 2009

Raros momentos

Ela precisava de ar puro. Já não aguentava mais a casa. Mas estava abafado e tanta gente na rua... Arriscou perto do fim da tarde. Caminhou até à praia e sentou-se numa rocha próxima do mar, longe das esplanadas e do burburinho da multidão domingueira.
Ali o ar estava puro e só via as ondas revoltas, espraiando-se num branco azulado de rara beleza. Sentiu-se bem. Aproximou-se mais do mar e empoleirou-se naquela rocha cinzenta que ficava completamente rodeada da espuma do tal branco azulado de rara beleza. Deu-lhe vontade de rir, só de pensar que o mais certo era apanhar com uma onda em cima. E não se moveu. O tempo parou. Era só ela, o mar, o céu azul. Uma união perfeita com o universo alinhado. De onde a onde imaginava que as rochas ao longe, de facto, pareciam barcos encalhados, como alguém havia dito. Lamentou não ter levado a máquina fotográfica para capturar a água com a espuma branca azulada de rara beleza que inundava tudo à sua volta, para mostrar a esse alguém.
Passado muito tempo, levantou-se. Num ritual prazeiroso, apanhou seixos de várias cores e feitios e foi enchendo os bolsos. A tal onda por que esperava desde o início apareceu. Mas ela foi mais rápida e ganhou a corrida. Desatou às gargalhadas, só de pensar no banho que acabara de evitar. Espreguiçou-se e respirou fundo. De novo sorriu a olhar o mar brilhante. Estava bem. Não precisava de mais nada.
Apesar de ser dia 15 e as cinzas do pai estarem algures naquele mar, pela primeira vez não sentiu aquela tristeza que a tolhia e se prolongava pelos dias e semanas seguintes. Deixou-lhe pétalas de rosa vermelhas, pousadas devagar na onda de um branco azulado de rara beleza que de imediato as absorveu.
Longe das gentes domingueiras, do calor abafado, da casa em desalinho, dos deveres, dos problemas, dos desafios, dos outros, ali, só com as rochas e o mar, sentiu-se por momentos completa, no meio do branco azulado de uma beleza indescritível e do laranja que anunciava já o pôr-do-sol.