Lá estavam eles a jogar futebol, num relvado perfeito, junto a uma enorme escarpa em abismo, mesmo no fundo, junto ao mar daquela ilha vulcânica em que a areia é escura e fina. O mar batia contra as rochas milenares e espumava contra a ilha, tudo numa normalidade instável, enquanto eles, as estrelas, jogavam divertidamente futebol a desafiar as águas. Estavam quase todos: Figo, Rui Costa, Cristiano Ronaldo, Futre, Bruno Alves, Lucho, Lisandro Lopez, Ricardo Carvalho...e, naturalmente, Pauleta.
Sim, estávamos nos Açores, na Ilha de São Miguel, junto à Povoação, na zona das Sete Lombas, a entrevistar os pais de Pauleta.
-Sabem meus senhores, em tempos vimos no jornal um anúncio de um miúdo que dizia: vende-se terreno que não serve absolutamente para nada por 2.000 euros. Achamos lindíssimo, um refúgio, e comprá-mo-lo para o nosso menino. A pronúncia era açoriana típica, cantada e com os ius típicos.
O terreno é muito pequeno, mas a escarpa, a pique, tem 500 metros e dá directamente para aquela praia, a que só se chega de barco.
Quisemos oferecer isto ao nosso filho, para ele trazer quem quisesse, as namoradas também, não sei se me está a entender...
Mandámos vir um decorador e aqui está o quarto de sonho.
Entramos pelo pequeno jardim cheio de flores exóticas que dava para um T1 coberto de vegetação. Quando abrimos a porta, a mãe mostrou, orgulhosa, o quarto de Pauleta. A cama era enorme, em docel, tudo acetinado em tons de azul, todos os tons de azul, nas paredes havia sereias e gárgulas que jorravam água, e colunas rócócó espalhavam-se aleatoriamente. Espelhos por todo o lado, inclusive no tecto.
Sabe, queríamos dar um ar muito sofisticado ao quarto e queríamos que o som do mar se prolongasse para o som das fontes, por isso contratamos um arquitecto e designer do Continente, da Capital, o homem vinha muito bem recomendado, um tal de Taveira, e fez esta magia, algo entre o civilizado e as cavernas, que era o nosso desejo. Ficou mais cara a decoração do que o terreno e a casa. Nem tem comparação, o preço dos serviços!
O quarto abria-se para o mar numa varanda deslumbrante. Lá em baixo, ao fundo da falésia, pareciam mosquitos a jogar.
-E os senhores onde moram?
-Não há espaço para tudo, moramos num anexo num terreno ao lado, uma coisa clandestina, feita pelo meu marido, mas não coloque isso na reportagem.
Nada daquilo dizia com a personalidade do Pauleta, que tem o ar pacato de um bom pai de família e já nem se dedica à bola, mas às fatias. Não estaríamos nós na ilha errada, com a mãe errada e o jogador errado?
Acordei sem saber a resposta. E também não vi o iate que podia permitir o acesso ao estádio de ninguém...
Acordei sem saber a resposta. E também não vi o iate que podia permitir o acesso ao estádio de ninguém...
Adenda: naturalmente que também lá estava o Vítor Bahia, o jogador com mais títulos de sempre, uma beleza para os olhos, só por ter uma branca é que não o coloquei que eu não sou nenhum Gillberto Madaíl de saias.