Criados e adormecidos pelos fados das grafonolas, dos giradiscos e das vozes roucas dos avós, a geração dos fins dos anos 90 curtia Amália em segredo, a Amália velha, afónica, embriagada, perplexa.
Nesses dias, era uma vergonha admiti-lo em público, mas era também uma rebeldia sintonizada e expressa em português e, ao fim dos Doors, vinha Ela, de braços abertos levar mais longe a viagem, contra o admirável mundo novo.
Eram tempos de guitarras maradas, sem professores de acordes, de bombos e testos, de vestidos góticos, de calças rotas e estrelas da mercedes penduradas no peito. No meio dos charros, dos poemas, sentados na roda do Schopenhauer e Nietzche, vibravam, desafinavam e garantiam que Amália era substância de Dionísio sentada ao centro.
Hoje canta-se Amália, por todo o lado. O universo está sempre em sintonia, não há ideias únicas, nem originais, podemos pensar no Porto o que outros pensam em Lisboa, ainda que uns e outros tenham guardado segredo por uma boa dezena de anos.
PS: Este texto não merece referir Amália, tenham um pouco de paciência.