Da solidão e outros demónios
Andava a sentir-se cansada há vários dias. O cansaço vinha do coração. Era uma pressão no peito. Deitou-se. Era criança, estava na casa dos avós, palco de solidão e discussões de que não gostava. O pai tinha ido à caça e deixara-a lá com a mãe. Estranhamente, a mãe ria-se e conversava. Ela pedia que a levassem para casa porque não queria morrer em Avintes. A mãe nem a ouvia. Sentiu-se completamente só e abandonada. Abriu os olhos. Tinham passado mais 50 anos. Estava só e abandonada num quarto com bolor e desalinhado. O coração acelerado. Doía-lhe o peito. Telefonou à mãe. A mãe voltou a não ajudar. Não percebia o que ela dizia. Estava surda. Ninguém à volta. A morte a espreitar. Essa não a abandona.